Juros remuneratórios, juros moratórios e correção monetária após a lei dos juros legais (lei 14.905/24): Dívidas civis em geral, de condomínio, de factoring, de antecipação de recebíveis de cartão de crédito e outras
RESUMO
Tendo em vista a extensão deste texto – justificada pela necessidade de digerir ao leitor um assunto recheado de conceitos da economia não tão familiares -, convém começar o presente texto resumindo, em frases diretas, as ideias principais.
Segue resumo das ideias do texto:
A lei dos juros legais (lei 14.905/24) promoveu alterações relevantes na sistemática dos juros remuneratórios, dos juros moratórios e da correção monetária. Buscou uniformizar essas regras para todas as dívidas civis, inclusive para as de contribuição condominial. Sua entrada em vigor dar-se-á em 30/8/2024 (capítulos 1 e 6).
Convém que a calculadora interativa a ser criada pelo BACEN – Banco Central do Brasil seja mais completa do que a atual Calculadora do Cidadão e ofereça cálculos mais completos com diferentes marcos temporais e diferentes eventos, com funcionalidades até mais avançadas das tradicionais calculadoras disponibilizadas pelos sites de Tribunais. A ideia é permitir que o cidadão, com facilidade, obtenha um resultado rápido (capítulo 1).
Juros remuneratórios são preço e são devidos no período da normalidade contratual. Já os juros moratórios são devidos no período da anormalidade. A permissão, em contratos bancários, de cobrança de juros remuneratórios no período da anormalidade é fruto de atecnia taxonômica e representa, na verdade, uma espécie de indenização por lucros cessantes (capítulo 2).
O índice supletivo de correção monetária para as dívidas em geral é o IPCA – Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo, índice que mede, de oficial, a inflação no país (capítulo 3).
Convém que o CNJ esclareça que os débitos judiciais deverão passar a ser corrigidos pelo IPCA, e não mais pelo INPC. Similar medida de esclarecimento pelo Poder Executivo mediante decreto seria bem-vinda (capítulo 3.2.).
Os juros moratórios convencionais não podem exceder o dobro dos juros moratórios legais (capítulo 4.1.).
Os juros moratórios legais é o resultado positivo da seguinte equação: Taxa Selic – IPCA (capítulo 4.2.).
Em regra, os juros remuneratórios não podem exceder o dobro dos juros moratórios legais e não podem sujeitar-se a capitalização em periodicidade inferior à anual (capítulo 5.2.).
Não se aplica o teto dos juros remuneratórios nem outras restrições da lei de usura (como a vedação de capitalização de juros em periodicidade inferior à anual) para obrigações entre pessoas jurídicas ou para obrigações no âmbito do mercado financeiro (capítulo 5.2.2.).
No caso de alguma pessoa natural vier a ser considerada coobrigada ou corresponsável de uma dívida de pessoa jurídica com juros remuneratórios acima do teto dos juros remuneratórios (como nos casos de fiança ou de desconsideração da personalidade jurídica), há necessidade de recálculo da dívida. É que a pessoa natural só pode ser obrigada a juros remuneratórios acima do teto da lei de usura em obrigações no âmbito do mercado financeiro. A integralidade da dívida originária, sem a restrição do teto, só pode ser cobrada da pessoa jurídica (capítulo 5.2.3.).
Mesmo nos casos de não incidência do teto da lei de usura, o índice pactuado de juros remuneratórios pode ser considerado nulo por abuso de direito se excederem colossalmente a média de mercado, sem qualquer justificativa da particularidade do caso concreto (capítulo 5.2.3.).
É descabido invocar o teto da lei de usura em operações de factoring ou nas de antecipação de recebíveis de cartão de crédito, pois inexiste aí o fato gerador dos juros remuneratórios (capítulo 5.2.4.1.).
As novas regras de juros remuneratórios não se aplicam a contratos anteriores, nem mesmo sobre prestações pendentes ou vincendas. É diferente do que se dá em relação às novas regras de juros moratórios, que atingirão as prestações pendentes ou vincendas de contratos anteriores (capítulo 6).
1. Introdução e a necessidade de a calculadora do BACEN ser mais funcional
Qual é o índice dos juros moratórios legais? Há teto para os juros remuneratórios? Qual é o índice devido a título de correção monetária?
Este artigo volta-se a discutir essas questões diante do cenário desenhado pelo que chamamos de lei dos juros legais (lei 14.905/24), que entrará em vigor em 30/8/24.2
Averbamos que a nova lei preferiu adotar índice oscilante para lidar com o tema, o que inevitavelmente torna os cálculos mais complexos. Prova disso é que o art. 4º da lei dos juros legais (lei 14.905/24)3 determina que o BACEN disponibilize ao público uma espécie de calculadora interativa.
A nova lei não seguiu uma alternativa muito vantajosa em termos de simplificação e de sistematicidade (a adoção um percentual fixo de juros moratórios legais) sugerida no recente anteprojeto de reforma do Código Civil4 e tão magistralmente defendida pelo ministro Luis Felipe Salomão em recente voto perante o STJ por ocasião do julgamento do REsp 1.759.982/SP.5
Seja como for, o ideal é que, no mínimo, a calculadora interativa seja mais completa do que a atual Calculadora do Cidadão disponibilizada no site do BACEN6 e vá além para oferecer cálculos mais completos com diferentes marcos temporais e diferentes eventos, com funcionalidades até mais avançadas das tradicionais calculadoras disponibilizadas pelos sites de Tribunais. A ideia é permitir que o cidadão, com facilidade, obtenha um resultado rápido.
Desde logo, fazemos uma ressalva de nomenclatura: Apesar de o texto legal referir-se a taxa de juros (art. 406 e 591, CC), trata-se de atecnia jurídica, pois taxa é um tipo de tributo. Preferiremos o verbete índice em nome da adequada taxonomia jurídica.
A propósito, agradecemos ao amigo professor Rafael de Castro Alves, consultor legislativo do Senado Federal, advogado e ex-procurador do BACEN, um dos juristas mais especializados no tema, pelas reflexões que travamos sobre o assunto e que nos ajudaram no amadurecimento de vários pontos.
Também registramos agradecimentos ao amigo professor Marlon Tomazette, um dos maiores empresarialistas brasileiros, com quem também pudemos amadurecer reflexões mediante conversas informais.
Confira aqui a íntegra da coluna.
Fonte: Migalhas
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